DEFESAS
RESUMO

 

Dissertação completa - Arquivo PDF

 

 

PÂNICO MORAL NA E PELA CINEMATOGRAFIA NACIONAL:

LAÇOS DE FAMÍLIA E HOMOAFETIVIDADE NO FILME TATUAGEM

 

Marcieli Cristina Coelho

marcielicoelho@yahoo.com.br

 

 

Esta pesquisa parte de uma perspectiva arqueogenealógica e tem como objetivo geral compreender o modo como o discurso cinematográfico nacional, mais precisamente o filme Tatuagem (2013) dirigido por Hilton Lacerda, por meio de um simulacro do cotidiano das relações, desconstrói a normalidade heteronormativa cristalizada na nossa sociedade brasileira. Dessa forma, questiona a conduta ética-moral vigente e promove reflexões sobre o medo diante de mudança em relações familiares. Para esse percurso, estabelecemos como objetivos específicos: (i) demonstrar os mecanismos de saber-poder circunscritos à questão da (homo)sexualidade; (ii) compreender a atuação do dispositivo do “pânico moral”, sobre relações homoafetivas na sociedade nacional; (iii) identificar se há e quais são as estratégias de normalização circunscrita na materialidade fílmica selecionada. Para tanto, problematizaremos os conceitos de norma e normalização, que constituem e movimentam as novas formas de se relacionar, possibilitando perceber a emergência de um temor, um pânico moral que atinge a sociedade ocidental de uma forma geral, contudo em nossa pesquisa faremos um estudo específico do Brasil. Trata-se de um pânico que evolui e aumenta, na medida em que as práticas sexuais e amorosas que são reorganizadas pelo casamento em uma relação imaginária com o Estado colocam em risco a instituição família. Como espaço de circulação dos sentidos, o cinema, dentre outras mídias, comporta mecanismos que conformam efeitos de verdades e modos de existência a partir de uma dada realidade social, (des)identificando os sujeitos espectadores. Dadas as condições de fazer circular saberes e poderes, o cinema funciona como prática discursiva que permite compreender o mecanismo sociopolítico contemporâneo, e em cujas práticas sociais, os sujeitos são governados por jogos de poderes. Considerando o discurso cinematográfico uma superfície de emergência de enunciados que (re)apresenta, constitui e (re)significa sentidos sobre as outras relações, a presente pesquisa foi norteada pela seguinte questão: a mídia cinematográfica conforma uma conduta ética-moral vigente (do pânico moral) ou amplia ainda mais o pânico instaurado na sociedade? Tal questionamento deve-se ao princípio de que com a normatização dessas relações outras, por meio da Resolução 175/2013, promulgada pelo CNJ, houve acentuado crescimento nas produções cinematográficas nacionais que abordam o tema, versando tanto nas produções que retratam o homossexual em uma perspectiva social como, também, retratando as diversas formas de se relacionar. Por esse regime de funcionamento enunciativo, a inserção do homossexual nas telas do cinema se constitui por relações sócio-históricas que permeiam seus corpos, ultrapassando o domínio biológico e o midiático. O desejo da (homo)sexualidade, que até há pouco tempo nem sequer era mencionada na “ordem arriscada do discurso” (FOUCAULT, 2012, p.7), está, agora, vigente na ordem do dia. Embora em vigência, essas relações instauram temor à grande parte da população, dada a desestabilização sobre os alicerces que sustentam a estrutura da família tradicional. Tais implicações incidem sobre o político e o social, produzindo árduos contrapontos e duros diálogos, pois, ao mesmo tempo em que um certo regime de olhar se estabelece, relações homoafetivas são normatizadas. Em contrapartida, a norma, por si só, não produz a normalização, e sim incide e promove o “pânico moral”, conforme apresentado nas debandas das salas de cinema, após as cenas de sexo entre duas personagens do mesmo sexo. Sob tal perspectiva, o dispositivo da aliança, da sexualidade e do pânico moral são regidos por uma tecnologia da governamentalidade, numa rede complexa de relações institucionais – sociais, jurídicas, familiares, religiosas, médicas, educacionais, políticas. Sob tal conjuntura e diretrizes, as reflexões teórico-metodológicas foram subsidiadas pela Análise do Discurso de linha francesa e seus desdobramentos no Brasil. De forma específica, analisa-se o filme Tatuagem (2013), de Hilton Lacerda, identificando se o discurso cinematográfico atualiza o dispositivo do pânico moral, se ameniza ou intensifica a sua existência. Outro ponto abordado são as estratégias fílmicas, como a nudez, as cenas se sexo e a relação familiar, utilizadas pelo filme de uma normalização das relações homoafetivas, e em quais aspectos essa ocorrência de desenvolve. Os resultados da pesquisa revelaram que as mudanças nos modos de se relacionar criam possibilidades à instituição família tradicional e ao Estado de requerem condutas que fazem viver o pacto da aliança e a deixam morrer a possibilidade de existência de relações outras, não normalizadas. Nesse entremeio, o cinema nacional, com o longa Tatuagem, faz viver em suas práticas e técnicas uma tentativa de normalização dessas relações outras, estabelecendo fios condutores de uma união que vai além do sexo e problematiza questões que envolvem amor, erotismo e família.

 

Palavras-chave: (homo)sexualidade; norma/normalização; cinema nacional; pânico moral

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